quinta-feira

Dias de vento


Gosto dos dias de vento. Sempre que o ouço a abanar as minhas janelas, não resisto a espreitar lá para fora para ver tudo o que ele mexe. Sabes, quando temos o coração acordado, até o vento pode conversar connosco. E dizer-nos muitas coisas importantes. A mim, que em frente à janela do meu quarto tenho umas quantas árvores, o vento fala-me sempre da importância das raízes. Sim, gosto dos dias de vento, porque me lembram a importância de ter raízes. Às vezes, parece que vivemos sem chegar nunca a lançar raízes profundas. Ter raiz significa encontrar um sentido verdadeiramente válido para viver, um sentido daqueles que as primeiras invernias não derrubam, perene, mais forte que a morte, como o Amor. Um dia, Jesus disse tudo isto contando a parábola de duas casas.
Era uma vez um homem insensato, que construiu a sua casa sobre a areia: veio a chuva, o vento e a tempestade e a casa ruiu. E havia um outro homem, este sábio, que construiu a sua casa sobre a rocha: veio a chuva, o vento e a tempestade, mas a casa permaneceu. A casa sobre a rocha, como as árvores com raiz, como as vidas com sentido.
E lá fora, o vento continua a segredar-me tudo isto enquanto embala e empurra as árvores do jardim: vão-se as folhas, caem alguns frutos já tardios, partem-se alguns galhos mais frágeis, mas a árvore permanece, porque está enraizada. E assim o vento até a vai limpando. E o vento, assim, até vai espalhando sementes com as suas invisíveis mãos.
Estás a ver? Quando há uma raiz profunda, o vento forte até se torna para as árvores instrumento de purificação e fecundidade. Temos que lançar raízes, assumir motivos válidos para viver e enfrentar todos os ventos, olhos nos olhos. E no subsolo do nosso coração, temos que aprender dia após dia, que para os nossos corações enraizados não há problemas. Nunca há problemas, apenas desafios. Sim, transformar os problemas a chorar em desafios a vencer, esse é o segredo dos corações bem enraizados, para domar todos os ventos. Para isto, a aposta primeira não se faz nas folhas, nos frutos ou nos ramos débeis do nosso ser; tudo começa a jogar-se nas raízes, no sentido, nos critérios.
Olha, o vento a dançar por entre as árvores do jardim está ainda a dizer-me outra coisa: até na morte, até na morte a raiz é sinal de uma grande dignidade. Sabes: é que uma árvore morre sempre de pé…

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